Entrevista Correio do Povo – 10/06/2017

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CORREIO DO POVO – O senhor é a favor da reforma da previdência social brasileira?
DIOGO CHAMUN – Sou a favor de todas atualizações e modernizações na nossa legislação. No caso da Previdência é importante a atualização das suas regras pelo contexto diferente que o Brasil vive hoje.

CP – Por quê é importante reformar a previdência?
CHAMUN – Para que haja uma adequação a nova realidade. Por exemplo, a expectativa de vida do brasileiro aumenta, então é justo que seja considerado no cálculo do benefício.

CP – O déficit da previdência, seu rombo, foi de R$ 149,2 bilhões em 2016 e para este ano é calculado em R$ 181,2 bi. Essa conta é a lei ou parte desse buraco pode ter vindo de problemas históricos de gestão, ou desvios?
CHAMUN – A Previdência é um grande “negócio”, já que na sua origem, via de regra, recebeu contribuições na frente para pagar os benefícios somente décadas depois. Em função disso, não há dúvida que o maior problema está na má gestão e nos desmandos/desvios, restando apenas uma pequena parcela nas regras que beneficiam uma parcela dos cidadãos.

CP – Quais são as maiores distorções da atual estrutura legal da previdência do país?
CHAMUN – As maiores distorções encontram-se, sobretudo, no fato de que apesar de termos uma previdência solidária (ou de repartição) ou seja, os ativos financiam os inativos existem quatro regimes diferentes.
O princípio da previdência solidária, em oposição ao de capitalização onde as contas são individuais, contém uma moralidade em que não se esperaria que houvesse qualquer diferenciação.
Contudo, no Brasil vigoram duas regras previdenciárias para o setor privado (Regime Geral Prev. Social), urbana e rural, e duas regras previdenciárias para o setor público federal (Regime Próprio Prev. Social), civil e militar, pelo menos. Há que se ressaltar que temos outras regras previdenciárias ainda nos governos estaduais.
Então, as distorções nascem de critérios distintos e que produzem desigualdade no tratamento dos cidadãos.

CP – A atual previdência é injusta ao trabalhador?
CHAMUN – Na legislação atual temos diversas regras por setores e tipo de atividades, e nesse contexto, existem tratamentos diferentes. Entendo, em regra geral, que ela não é prejudicial ao trabalhador, pelo contrário, os casos de injustiça são em favor do trabalhador, em especial na área pública.

CP – O que seria uma boa lei previdenciária?
CHAMUN – Seria uma regra justa que contemplasse a expectativa de vida no Brasil e não punisse o trabalhador, condenando-o a laborar por quase 50 anos. Outro fator importante é que se equiparasse, ou ao menos, diminuísse as diferenças entre o regime geral (INSS) e o regime próprio (setor público)

CP – A reforma, como acusam centrais sindicais, vai penalizar o empregado ao fixar 40 anos de trabalho com idade mínima os 65 anos homens e 62 mulheres para obtenção de aposentadoria integral. O senhor concorda? 
CHAMUN – Concordo. Não podemos repassar a conta do déficit da previdência para o trabalhador que ganha menos. O desequilíbrio orçamentário da previdência tem origem, na sua grande maioria, no setor público e é nesse sentido que deveria estar o foco.

CP – Qual é o impacto da previdência hoje nas empresas?
CHAMUN – Pouco se repercute, mas empresas contribuem para o sistema de maneira significativa. No entanto, entendo que é justo e faz parte da estrutura previdenciária. O que não pode ocorrer é aumentar essa participação, sob pena retrair ainda mais a economia.

CP – A reforma como está sendo proposta vai corrigir distorções no custo das empresas?
CHAMUN – De maneira direta, não haverá reflexos nas empresas, mas o trabalhador que for se aposentar mais tarde, com idade avançada, certamente terá uma menor produtividade.

CP – Com as novas regras à reforma haverá maior contratação de trabalhadores, haverá maior empregabilidade?
CHAMUN – Não vejo qualquer relação.

CP – Senadores e deputados eleitos em 2018 entrarão na nova regra?
CHAMUN – A nova regra na íntegra vale somente para quem for eleito a partir de 2018 e nunca tenha exercido mandato. O parlamentar que tem mandato em vigor ou já exerceu mandato, terá uma regra de transição, mas não perderá a possibilidade de se aposentar com 100% do seu salário ao completar 35 anos de contribuição como congressista, que é a principal vantagem.

CP – O senhor acha que, por exemplo, que militares foram discriminados positivamente na proposta de reforma do governo? 
CHAMUN – Sabemos que cada setor tem suas particularidades e defendem seus interesses, mas esse é o que possui as maiores distorções e portanto deveria ser revisto.

CP – Quais são os países, na sua avaliação, modelos em previdência social?
CHAMUN – Quanto a modelos de previdência devemos respeitar as características regionais brasileiras, uma vez que o perfil de atividade laboral é distinto entre as economias regionais, tal como já acontece na legislação estadual de salário mínimo. Nenhum país do mundo tem a heterogeneidade brasileira quando se menciona a característica econômica regional.
Um regime de previdência social ideal é aquele que ampara o cidadão em caso de necessidade (velhice e/ou invalidez) e proporcione recursos de poupança aos projetos de desenvolvimento do país.
De todo modo, modelos são previdências que possibilitam um regime de capitalização, onde o próprio cidadão é o curador de sua conta, depositada junto a um fundo de pensão público ou privado. Nesse caso, a discussão sobre idade mínima perde sentido, pois dependendo do acúmulo de recursos e da perspectiva de vida o cidadão pode exercer/reclamar a sua aposentadoria.
A maior parte dos países da América Latina segue esse modelo. Casos do Chile, México e Colômbia, dentre as economias mais representativas. Na Argentina após sua adoção nos anos 90, o sistema voltou a ser de benefício solidário em meados do final da década passada.
No caso chileno, toda a previdência, além de possuir o regime de capitalização, é privada, ainda que regulada pelo governo. Essa regulação atua no sentido de disciplinar as aplicações e prevenir quebras de fundos, bem como dar confiança ao público. É possível notar, ademais, que desde sua adoção nos anos 80, a poupança privada no Chile subiu, fomentando a bolsa de valores, os investimentos em títulos públicos e o acompanhamento, através dos extratos, das opções de investimentos pelo cidadão.

CP – Por quanto tempo a reforma manterá equilíbrio nas contas. Será necessária outra reforma em uma década, por exemplo, existe um modelo ou solução duradoura?
CHAMUN – A durabilidade da reforma dependerá das concessões realizadas durante o processo de negociação do projeto.
Em sua forma original, a reforma proposta garante uma transição segura, isso significa manutenção do déficit previdenciário nos atuais patamares, pela próxima geração, ou seja 40 anos à frente.
Caso contrário, o déficit com previdência pode atingir até 6% do PIB.

CP – A reforma, acusam centrais sindicais, atendem mais aos interesses das empresas. O que o senhor acha isso?
CHAMUN – Não há relação direta. Se estivéssemos repercutindo a Reforma Trabalhista concordo que há melhorias para as empresas, mas falando de previdência o único interesse dos empresários é equacionar o problema orçamentário e destravar a economia.

CP – O senhor acha que o atual governo conseguirá fazer a reforma, ou essa questão ficará para o próximo?
CHAMUN – Infelizmente as decisões importantes e que definem a vida dos brasileiros são políticas e não estritamente técnicas. As votações que deveriam levar em conta estudos e aprofundamentos, independente de interesses individuais, se dão por bancada, composição e alianças. Nesse contexto, acredito que a reforma será aprovada, sempre cabendo mais adequações.